O vírus HPV e o cancro do colo do útero
Prémio Nobel da Medicina 2008: Harald Zur Hausen
O cancro do colo do útero permanece como uma das neoplasias mais prevalentes no mundo sendo observados 500 mil novos casos todos os anos causando a morte a quase 300 mil mulheres. A incidência anual desta neoplasia diverge consoante a localização geográfica das populações estudadas. Em Portugal, estima-se em 1000 o número de novos casos todos os anos, apresentando a incidência mais elevada da Europa Ocidental.
*Investigador e Professor Universitário com Agregação, Coordenador do Grupo de Oncologia Molecular do Instituto Português de Oncologia do Porto e Presidente da SPPV-Sociedade Portuguesa de Papilomavirus
O Prof. Harald Zur Hausen, a quem foi agora atribuido o Prémio Nobel por ter proposto que o papilomavirus (HPV) estaria na origem do cancro do colo do útero, iniciou a investigação nos anos 70, quando em 1972 e por estudos de biologia molecular não consegue detectar a presença dos virus Herpes em amostras de células tumorais obtidas do colo do útero.
Este resultado negativo permitiu desenvolver o estudo da próxima hipótese que envolvia a detecção dos papilomavirus nestas amostras o que se confirmou com a confirmação da presença das suas sequências genéticas. Desde então, o grupo do Prof. Zur Hausen, Lutz Gissmann, Ethel de Villiers, e outros sediados em Heidelberg, identificaram em 1983 a presença de HPV 16 (um dos HPV oncogénicos) em lesões pré-neoplásicas e em 1985 caracterizaram a organização genética e a actividade do DNA do HPV nas celulas tumorais do colo do útero.
A infecção por HPV (Papilomavirus Humano ou virus do papiloma humano) é uma das doenças sexualmente transmissíveis mais comuns nos adolescentes e adultos jovens com prevalências que podem atingir os 50%. A infecção por HPV é frequente nos jovens sexualmente activos em particular nas idades entre os 16 até aos 25 anos de idade. O desenvolvimento de condilomas anogenitais, displasias e cancro do colo do útero está claramente associado a infecção por este vírus.
Os estudos epidemiológicos têm demonstrado uma forte associação entre o cancro do colo uterino e padrões de comportamento sexual. A principal forma de transmissão do HPV é a via sexual sendo considerada uma das principais infecções sexualmente transmissíveis (DSTs). Idade precoce da primeira relação sexual e a existência de múltiplos parceiros são factores de risco bem aceites. Hábitos tabágicos, uso de contraceptivos orais, presença de doenças venéreas, algumas deficiências nutricionais e raça/etnia, têm também sido descritos como factores de risco para o cancro do colo uterino.
O risco de infecção aumenta com o número de parceiros sexuais independentemente de o indivíduo ser do sexo masculino ou feminino. Diversos estudos têm sido publicados pelo nosso grupo de Oncologia Molecular/Virologia do Instituto Português de Oncologia do Porto que demonstram a importância de outros factores além do vírus HPV (sendo este o factor iniciador obrigatório) no desenvolvimento do cancro do colo do útero na população portuguesa. O vírus terá um papel como iniciador do tumor e existem cofactores que irão facilitar/promover a evolução para cancro.
O “background” genético parece ser um dos cofactores que influenciam este cancro. Outro cofactor importante parece ser o fumo do tabaco no desenvolvimento precoce desta neoplasia. O conhecimento destes cofactores tem grande importância no contexto das sociedades ocidentais, em que as primeiras relações sexuais acontecem precocemente e existem cada vez mais mulheres jovens e adolescentes que fumam, resultando numa mistura explosiva quando associadas a um vírus oncogénico.
Além do cancro do colo uterino, os vírus HPV, estão também associados a alguns tipos de verrugas genitais e ainda a outras neoplasias anogenitais. Existem identificadas mais de 90 variantes (tipos) do HPV, sendo cada novo tipo de HPV caracterizado com base na seqüência do DNA viral. Quarenta tipos de HPV podem infectar o tracto urogenital e destes cerca de 17 estão associados ao desenvolvimento de cancro sendo conhecidos por HPV de alto risco ou HPV oncogénicos.
A investigação nesta área demonstrou que as proteínas virais complexam com proteínas do hospedeiro importantes na regulação do ciclo celular. Entre os HPV oncogénicos, temos o HPV16 e HPV18 como os mais frequentemente encontrados no cancro do colo uterino. Os HPV6 e HPV11 são também associados a verrugas genitais mas não provocam cancro.
É um facto que o cancro do colo do útero continua a ser um grave problema de saúde em Portugal. Sendo uma neoplasia provocada por um vírus, é possível agora fazer o seu rastreio e a sua prevenção através da vacinação e da formação acerca dos vários factores de risco conhecidos. (...)
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